junho 18, 2007

D2


Marcelo Maldonado Peixoto, 35 anos pai de três filhos, mais conhecido como Marcelo D2. Uma pessoa que pode se dizer sagaz e até cascudo, veio direto do Andaraí, bairro da Zona Norte do Rio de Janeiro. Foi camelô quando jovem, antes de fundar o Planet Hemp, primeira banda a fazer apologia a maconha no início dos anos 90. Lançando seu sétimo disco, sendo cinco com o Planet Hemp, uma coletânea e o mais novo “À procura da batida perfeita”, uma fusão bem feita de rap com samba e com letras cada vez mais maduras e com batidas e levadas diferenciadas e surpreendentes, num bom disco. Em conversa com o jornal International Magazine na edição (93), D2 falou de seu novo trabalho, como o concebeu e o orgulho de ter lançado um disco de rap com misturas de samba.


Quantos discos lançados?
Foram quatro do Planet Hemp, dois solos meus e um que é Hip Hop Rio, uma coletânea, este seria meu sétimo disco.

Como foi o primeiro disco solo “Eu tiro é onda”? Alcançou o esperado?
No Primeiro disco “Eu tiro é onda”, aconteceram algumas coisas. Era uma época em que eu não estava tranqüilo. Estávamos num período em que fomos presos (Planet Hemp), meu pai morreu assim que eu terminei o CD. Não foi uma fase muito boa. O disco não foi fácil de trabalhar, apesar dele ter vendido 80 mil cópias, mais do que o esperado. Fiz poucos shows para divulgar. Acontece que assim que eu acabei de fazer o disco, senti que faltava alguma coisa, que na realidade era o samba. Eu precisava ter colocado mais samba no rap. O rap esta começando a se estabilizar no mundo. Você hoje em dia tem artistas de peso como Gabriel (Pensador), Racionais, o rock do Planet Hemp, o Xis e até mesmo o Sabotage. Demorou quatro anos o processo do primeiro disco para o segundo “À procura da batida perfeita”. Fizemos dois do Planet Hemp ao vivo e um de estúdio, mas pensando neste meu disco o tempo inteiro. Eu não coloquei a mão na massa os quatro anos porque estava sempre envolvido em outros trabalhos. Mas chegou um momento em que eu cheguei para dois caras que me ajudaram a fazer este CD (Davi Corcos e Mário Caldato) e falei: “Vamos fazer agora este disco?” O Davi que é muito meu amigo e o próprio Mario que já trabalha com agente desde o Planet e no meu primeiro solo. Neste disco ele é uma espécie de amigo mesmo, sou padrinho da filha dele. Estes caras foram os que mais me ajudaram a fazer este trabalho, foi assim que começamos a elaborar o disco.

Vamos falar sobre “À procura da batida perfeita” ?
Eu gostaria que muita gente ouvisse este disco. Gostaria também que ele inaugura-se uma nova era no rap. Não que eu tenha inaugurado até por que, já foi inaugurado. Eu quero dizer é que da para se fazer um disco de rap brasileiro, com músicos brasileiro e bem produzido. Um disco que quando tocado o ouvinte identificar como um rap do Brasil. Esta é minha expectativa. Vou começar a fazer shows em breve. Agora turnê mesmo para divulgar o disco, somente no segundo semestre. Estou muito orgulhoso de ter feito este disco e espero está dando uma contribuição positiva para o rap do Brasil. Falo isso em agradecimento por tudo o que o rap fez por mim, simplesmente tudo que tenho agradeço ao rap. Não sou músico faço rap. Cantei a legalização da maconha, cantei contra a polícia, cantei liberdade de expressão, ta ligado? Fiz um disco falando de samba e valorizando os arquitetos da musica brasileira e dando ênfase ao samba. Eu vejo que os sambistas mais antigos olham até com outros olhos, achando que isso que faço não é musica. Mas isto é o que é agora. Eu respeito muito o Cartola e Paulinho da Viola e muitos outros da antiga. Hoje em dia nós somos americanizados! Comemos no Mc Donald’s, usamos tênis Nike, temos influências de várias coisas, assim como tenho do samba. O rap pode tomar um rumo no Brasil fortalecendo-se como musica brasileira. É um meio de várias pessoas poderem fazer musica sem saber tocar instrumento algum. É por isso que estou muito orgulhoso deste disco.

Como foi ter seu filho participando de seu disco?
Sempre quis escrever uma musica para o meu pai. Mas sempre achei que era meio brega. Um dia estava andando de carro com meu filho e ele no banco de trás cantando todas as rimas do Hip Hop Rio. Até brinquei com ele, “Vou fazer uma letra para você cantar”. Quando estava fazendo o disco pensei em fazer uma homenagem ao meu pai e chamei meu filho para cantar junto comigo. A letra não fala necessariamente do meu pai, mas fala da nossa família, o que aprendi com meu pai e estou passando para o neto dele. Esta foi a melhor maneira de homenageá-lo.

Fale-me das participações de convidados.
Tem a participação do Mamão que já tocou com o Tutti-Frutti e Azymuth, e tantos outros artistas. Eu considero o Mamão um arquiteto da música brasileira, assim como João Donato e Bezerra da Silva. Tenho uma admiração muito grande por estes músicos mais experientes. No caso do Mamão ele tocou bateria com muita gente boa. Para mim é uma burrice falar que os grandes músicos são aqueles que venderam milhares de discos. Esses caras não são aqueles que aparecem na frente do palco, mas são aqueles que fizeram o disco e nem sempre a mídia dá o valor merecido para eles. Tem o Tuca, filho do Bezerra da Silva que toca bastante percussão, Seu Jorge que é meu compadre também. Tem o Rafael Crespo que é do Planet fez uma guitarra na música “Qual é?”. O Pedro Garcia que entrou no lugar do Bacalhau no Planet, não tocou nada, mas gravou algumas coisas em seu estúdio caseiro. Tem a participação também do produtor Mario Caldato onde dividimos a autoria da faixa “Vai vendo”. O próprio Mario atendendo minha sugestão trouxe o DJ Mix Mastermike. Que foi irado! Ficou perfeito! É um dj que se não for o melhor, está entre os melhores do mundo, para fazer este tipo de coisa (scratch). Foi uma experiência muito boa, até por que estava acostumado a trabalhar com o DJ Zé Gonzales que é o meu dj oficial. Ter a participação de Mix Mastermike no meu disco, significa para mim a mesma importância se tivesse um Luiz Bonfá, João Donato ou até mesmo Tom Jobim. Tem a participação também do Will. I. AM, em “C. B. Sangue Bom”. Ele faz parte de uma banda americana e que já sampleou Jorge BenJor. Outra participação é do Koolgmurder que toca com muita gente no EUA e no disco toca vários instrumentos. Se você prestar atenção ele toca baixo, teclado, banjo, piano, guitarra em várias faixas.


Como você compõe?
As letras na maioria eu fiz em cima da hora. Primeiro faço as bases e depois confecciono as letras. Estava sem compor uns cinco anos e fiz tudo na época de gravar.

Então se um artista te pede uma música você faz na hora e manda?
É. Foi assim com a música “Balança” quando participei do disco do João Donato “Managarroba”. Mas isso não é mole não! É um parto! Fiquei mais de duas horas olhando para o papel sem ter idéia nenhuma do que iria escrever. Até que vem algo e ai vou em frente.

Você ficou conhecido ficou conhecido através de uma banda que fazia apologia a maconha. O que mudou no D2?
Não mudou muito. Mas as coisas sempre mudam. Eu quando peguei este meu novo disco fiquei muito nervoso, cheguei a suar nas mãos, tremendo. Estava até comentando com minha esposa. Este é meu sétimo disco! Aquela ansiedade de ver o CD vim voando do Recreio dos Bandeirantes até o Flamengo. Este tipo de reação não mudou, mas já se passaram dez anos. Tive discos que venderam bastante, tenho uma história, continuo a freqüentar a Lapa, fico até de manhã bebendo com meus amigos. Só que eu não tenho mais vinte e poucos anos, agora são trinta e cinco anos! Tenho meus filhos. Não ando mais de skate, não sou mais aquele molecão da Lapa. A vida muda né? Isto reflete bastante nos disco. Quando pego uma letra que fiz há quinze anos e comparo com as de hoje, acho muita diferença. Escrever uma música como “A culpa é de quem?”. Eu tinha uns 18 anos, hoje não faria, tinha aquela revolta de quando se é jovem. Agora vejo as coisas diferentes, minhas letras eram mais diretas. Não tem mais refrões como “Legalize já!” e “Planet Hemp fazendo a sua cabeça!”. Aquilo era uma coisa meio panfletária mesmo. O Planet ainda tem coisas assim, agora no meu disco solo não tem nada disso. No Planet nos reunimos para fazer este tipo de coisa há mais de dez anos. Nesta época o rap tinha aparecido no Brasil e combinamos em fazer isso já que ninguém fazia. Mesmo sabendo que poderíamos ser presos por falar mal dos políticos, da policia. Foda-se! Era isto que nós queríamos. Neste meu disco a preocupação não é esta. Teve um amigo meu que um dia deste comentou comigo que eu parecia que estava dando uma lição de moral em alguém em uma de minhas letras. Coloquei no encarte do CD as letras para as pessoas lerem e tentarem entender, mesmo que seja de uma maneira diferente.

O Planet Hemp vai ficar na geladeira ou vai acabar?
Vai ficar né! Tem que dar uma parada até o ano que vem em função do meu disco solo, o Planet ainda não acabou.


Na época do lançamento do “Eu tiro é onda” o Planet Hemp tinha dado uma parada. Quando voltou veio com uma formação diferente. Qual foi o motivo?
Eu, Skank, Rafael, Formigão e BNegão e ainda outras pessoas como Marcelo Yuka... Olhando hoje eu vejo mais clara a situação. Teve momentos perturbadores naquele período. A policia nos perseguindo em todos os lugares, estávamos com uma exposição muito grande, nosso disco tinha virado disco de platina. Era uma parada absurda, isso pesa muito. E não é somente isso, depois de vender muito disco, a banda estava viajando muito. O primeiro a sair foi o Rafael, o Jackson que era roadie, assumiu a guitarra. Quando paramos, havia rolado uma briga geral, acabou o Planet Hemp, não oficialmente, mas tinha dado uma parada. Fui fazer meu disco solo. Quando voltamos encontrei com o Rafael e perguntei e ai beleza? Foi assim com Formigão e o BNegão e os outros. Com o Bacalhau não rolou, sabe colé? O Bacalhau simplesmente não voltou com o Planet Hemp, ta ligado ? Então decidimos colocar outro baterista, foi quando chamamos o Pedro Garcia que é filho do Bebeco Garcia (ex-Garotos da Rua) aquele guitarrista do Sul. O Rafael que estava fora, voltou. Isto é uma parada que é meio foda. É lógico que a nossa amizade ficou abalada, não nos falamos como antigamente, acho que um olha para o outro... É uma merda sabe? Isso não acontece só com o Bacalhau, isso acontece no mundo todo. Fomos muito amigos, eu sinto muito isso, de estar longe do cara. Mas a vida é assim mesmo às vezes temos que tomar certas escolhas. Ele tomou o rumo dele, toca numa banda. Nós nunca brigamos. Banda é assim mesmo eu aprendi isso nestes dez anos. Se fosse assim banda nenhuma teria se separado. O Planet já teve muita gente! Eu, Formigão, Skank e Rafael. O Bacalhau era o quinto elemento, depois que o Skank morreu veio o BNegão. Depois começou a entrar gente e sair como, Zé Gonzales, Negralha, Apolo 9, até o Yuka já tocou com a gente, gravou o disco ao vivo da Sony, foi logo depois que o Bacalhau saiu e não tínhamos baterista e o Marcelo Yuka tocou.

Você pretende fazer algum dia um disco de rock sem o Planet Hemp?
A minha veia de rock está ligado ao Rafael e o Formigão, que são meus parceiros de muito tempo e que tem mais condições de fazer um som deste tipo. Eu tenho vontade de fazer um som com o Rodolfo (Rodox). Fazer rock só mesmo no Planet que tem a base rock, com eu cantando rap em cima. Foi assim com a musica do Led Zeppelin no disco “Os cães ladram...”. Andamos até conversando sobre o próximo disco do Planet, podíamos ter um vocal de rock, já que o Rafael canta bem.

Publicado originalmente em julho de 2004 no jornal International Magazine edição 93.

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