Ele começou amando os Beatles! É produtor, pesquisador e proprietário do selo Discobertas. É editor do tablóide International Magazine – esteve à frente de lançamentos de caixas biográficas de nomes consagrados como Gilberto Gil, Erasmo Carlos, Roberto Carlos, Zé Ramalho e outros. Foi um dos responsáveis pela vinda do produtor George Martin (Beatles) ao Brasil no Projeto Aquarius no Rio de Janeiro em 1993, lançou em parceria com Ricardo Pugialli o livro – Os anos da Beatlemania. Em 2008, detona o bem sucedido, projeto Álbum Branco dos Beatles que completou 40 anos no mesmo ano - com vários artistas brasileiros interpretando na íntegra, faixa por faixa do lendário álbum duplo que originalmente tem o nome The Beatles e conhecido popularmente como White Album, que gerou a trilogia – Álbum Branco, As Outras Cores do Álbum Branco e Álbum Branco Indie Version. Neles estão incluídos canções obscuras e outras até então inéditas ao público. Figuras ilustres como Lobão, Paulo Ricardo, Zé Ramalho, Victor Biglione, Zélia Duncan, Raimundo Fagner, Cachorro Grande, Rodrigo Santos e George Israel, Autoramas, Frank Jorge, Apoena, Biquíni Cavadão, Branco Mello, entre outros que participaram. Agora ele lança a trilogia – Get Back de Volta aos Beatles, O Outro Lado da Abbey Road e Abbey Road Revisited, baseado nos discos Abbey Road e Let it Be do quarteto liverpooldiano, com artistas nacionais. Entre o quais Jota Quest, Mu Carvalho, Ivan Lins, Érika Martins, Sérgio Reis, Detonautas, Frejat, Flávio Venturini, Elis Regina e Milton Nascimento, Wanderléa, entre outros. Pude conversar com este produtor que diz ter mais novidades num futuro próximo. Deixemos o cara falar! Com vocês! Marcelo Fróes!
Por Elias Nogueira- Você vem fazendo ao longo dos anos, trabalhos, referente aos Beatles. Essa paixão é desde infância? É Influência de alguém? Quem te apresentou os Beatles?
- Não é nada proposital, mas realmente acontece de tempos em tempos. Talvez porque eu tenha absorvido tão bem a influência que ela se materialize de formas diversas, de tempos em tempos. Até meu interesse pela Jovem Guarda é decorrência da paixão pela música dos anos 60, que tinha nos Beatles seu maior estandarte. Meu irmão é oito anos mais velho e tinha alguns discos, mas acho que eu mesmo é que fui descobrindo sozinho e me interessando - não só pelos Beatles, como também por tudo que eles fizeram nas carreiras solo. Nem todo fã dos Beatles curte o que eles fizeram depois, não se dá ao trabalho de conhecer, mas eu sempre curti e é por isso que pude fazer projetos como "Álbum Branco" e "Beatles '69", que contém canções que foram gravadas em discos solo de John Lennon, Paul McCartney e George Harrison ao longo das décadas. Músicas feitas pelos Beatles no final dos anos 60 geraram conteúdo para discos que eles fizeram muitos anos depois, como foram os casos de "Circles" (George Harrison, 1982) e "Cosmically Conscious" (Paul McCartney, 1993). Só alguém que realmente acompanhou tudo o que eles fizeram e fazem até hoje poderia encontrar essas pérolas e levá-las para o repertório sessentista original. - Gostaria que falasse do atual projeto que reúne álbuns e canções do quarteto. Quantos álbuns lançados do projeto?
- Ano passado (2008) o projeto "Álbum Branco" gerou três CDs, e este ano por acaso também três. Da mesma forma que a trilogia "Álbum Branco" registrou todas as canções geradas no ano de 1968, a trilogia "Beatles '69" também traz tudo que eles compuseram e/ou gravaram no ano de 1969 - o último de atividades da banda.
- Como surgiu a idéia? Quando deu o estalo? Quanto tempo até ficar pronto?
- Quando lançamos os discos do projeto "Álbum Branco" entre setembro e novembro do ano passado (2008), um a cada mês, as pessoas já começaram a perguntar se não faríamos algo em 2009. Alguns queriam repetir "a brincadeira" e outros que não haviam gravado, queriam finalmente a oportunidade. Eu achava que o projeto "Álbum Branco" já fora bem grandioso, com muita gente boa e muitos Vips também, e que não seria viável superá-lo. Mas de repente bateu coragem em novembro mesmo e comecei a dar meus telefonemas e a trocar emails. As gravações basicamente rolaram entre janeiro e junho, o que nos dá um prazo de seis meses para gravar as 63 faixas envolvidas. Foi realmente uma façanha administrar tudo isso, porque era gente gravando em várias partes do país ao mesmo tempo.
- Como foi reunir tantos talentos em um trabalho?
- Eu acho que a paixão pela música dos Beatles foi o principal fator, é claro, além de saberem que é um projeto independente e feito por pessoas que gostam de música como arte. Contamos com a boa vontade não só dos artistas, mas também de músicos, produtores, engenheiros de som, donos de estúdio, designers, fotógrafos etc. Mais de 300 profissionais de música brasileira empenhados em fazer algo realmente bacana, como fora ano passado. Claro que a boa repercussão do "Álbum Branco" abriu muitas portas.
- Teve algum problema de liberação por parte dos herdeiros da obra dos Beatles?
- Não, nenhuma, porque eles já sabem que a gente faz um trabalho bem feito, respeitando as melodias e letras originais e com grandes artistas, músicos, produtores e estúdios. Enfim, é trabalho profissional e respeitoso e com respeito aos direitos autorais, que são devidamente recolhidos pela distribuidora etc.
- Têm canções inéditas. Tem como comentar e como foram descobertas?
- Ano passado eu já havia gravado a inédita "Dehra Dun", de George Harrison, com o Zé Ramalho. Foi por acaso que descobri que aquela inédita de George, gravada numa fita demo, estava registrada, inclusive disponível até aqui na sub-editora brasileira. Foi só pedir. Então, para 2009, fui fundo na pesquisa e saquei algumas inéditas que estavam igualmente registradas e disponíveis. São elas:
- Suzy Parker (Filhos da Judith) - dos Beatles, composta e apenas ensaiada pela banda, porém nunca propriamente gravada. Os Beatles podem ser vistos tocando a canção no filme "Let It Be", mas nunca a lançaram em disco.
- Paul's Piano Intro (Vitor Araújo) - de Paul McCartney, este tema instrumental de piano só existia até hoje num registro improvisado na abertura do filme "Let It Be". Mas nem Paul, nem ninguém havia gravado isso até hoje.
- How D'you Do (Mallu Magalhães) - de Paul McCartney, gravada somente numa demo de voz e violão por Paul. É um trava-língua meio inacabado, e Mallu e sua banda souberam fazer um registro bem bacana.
- Fancy My Chances With You (Doidivinas) - de Lennon & McCartney, composta no início da história dos Beatles e redescoberta durante os ensaios do projeto "Let It Be". Nunca saiu de breves ensaios, é praticamente inacabada, mas como estava registrada resolvemos gravar servindo-nos de citações de solos de guitarra de outras canções da fase inicial.
- Because I Know You Love Me So (Canastra) - de Lennon & McCartney, tem a mesma história da canção acima - embora tivesse mais acabada como canção, e por isso o Canastra pode interpretar as partes e depois criar uma fanfarra pra levar pra praia deles. Ficou bem legal.
- Taking a Trip To Carolina (Fuzzcas) - de Ringo Starr, só existia uma versão de 15 segundos do Ringo cantarolando isso durante os ensaios do projeto "Let It Be". Como estava registrada, propus aos Fuzzcas que criássemos um arranjo citando outras canções de Ringo da fase final. - Suicide (Twiggy) - de Paul McCartney, registrada em apenas oito segundos no primeiro disco solo dele, mas que pode ser gravada por existir uma performance de voz e piano que se encontra disponível até no YouTube. Ganhou um arranjo engenhoso de English jazz do maestro paulista Zezo de Almeida, e a bela voz de Twiggy.
- Você é dono do selo Discobertas - gostaria que falasse um pouco do selo, quantos anos de existência, novos lançamentos...
- O selo já existe há alguns anos, mas efetivamente saiu da idéia em 2007 - quando foi iniciada a parceria de um ano com a gravadora Coqueiro Verde, de Erasmo Carlos, nossa primeira distribuidora, fundamental naquele primeiro momento. Estamos agora na Microservice, que também distribui às gravadoras Som Livre, Deck Disc, MZA, dentre outras, e temos muita coisa para fazer em 2010 - inclusive nossos primeiros DVDs. Por ora, algumas surpresas ainda para antes deste Natal.
Faixa a faixa da segunda trilogia
Get Back
Naturalmente que os estímulos externos para realizar o projeto “Beatles ‘69” foram calcados no LP “Abbey Road”, mas eu sabia que se fosse para fazer um projeto nos moldes do realizado em 2008, com muitas canções e intérpretes, teríamos que mergulhar em todo repertório de 1969. E “Abbey Road” foi praticamente o capítulo final, então o começo do “Projeto 69” teria que ser com a fase “Get Back” – quando, em janeiro de 1969, os Beatles compuseram, ensaiaram e gravaram repertório para um LP que acabou não saindo em seu formato original. “Get Back” seria inevitavelmente a faixa de abertura e ainda em novembro de 2008 eu já estive com os rapazes do Jota Quest e os convidei para gravar a faixa. Eles viram os volumes do “Álbum Branco” e toparam na mesma hora, e gravaram em seu estúdio de Belo Horizonte nos primeiros meses de 2009. Don’t Let Me Down
Confesso que havia convidado uma outra banda mineira para fazer “Don’t Let Me Down”, também pessoalmente ainda no final de 2008, mas por algum motivo eles acabaram desistindo de participar. Na mesma época, Alvin L – que havia gravado “Not Guilty” no “Beatles ‘68” – mostrou o projeto de 2008 para Dinho Ouro Preto e recebi um telefonema de ambos, comentando que havia interesse de se participar em 2009. Sugeri “Don’t Let Me Down” e Dinho topou na mesma hora, e o Capital Inicial acabou gravando numa única sessão e recebi a gravação no mesmo dia. Foram muito objetivos e competentes, é ótimo trabalhar assim.
Two Of Us
Na minha visão, era realmente uma canção para se cantar em dueto. Por algum motivo, desde o começo imaginei que os amigos e parceiros Leo Jaime e Leoni poderiam fazer bonito. A gente se encontrou para um café no Shopping da Gávea, eles toparam a idéia e marcamos estúdio para gravar. Leo tinha uma idéia de arranjo e o pessoal da equipe criativa do estúdio Corredor 5 fez uma belo arranjo após uma primeira sessão. Os dois voltaram um mês depois, curtiram o resultado e gravaram o vocal final. Clemente Magalhães fez uma ótima produção.
Dig a Pony
O guitarrista Carlos Coelho, produtor e um dos cabeças do Biquíni Cavadão, é o grande beatlemaníaco na banda. No final de 2008 a gente se encontrou pra conversar sobre a edição do clipe de “Jealous Guy”, rodado para o DVD do “Álbum Branco” que ainda vamos lançar, e lembro que comentei que já havia movimentação por um projeto “Beatles ‘69”. Em poucos dias ele mandou email reservando “Dig a Pony” e aí a banda acabou gravando mais pro meio do ano seguinte. Ficou bem legal a gravação desta canção que no Brasil já foi cantada até por Marisa Monte.
Across The Universe
Era ainda 2 de outubro de 2008 quando Rodrigo Santos reservou “Across The Universe”. Certamente foi um dos grandes estímulos para se fazer o projeto 69, pois a trilogia do ano passado nem tinha terminado de sair. Ele estava gravando seu segundo CD solo e pelo visto já estava de olho na canção, então caiu dentro com um motivo reforçado. No feriado de São Jorge, 23 de abril, fomos a Petrópolis para gravar o coral das meninas do Colégio São José e na volta ele fechou a gravação e a mix com o Kadu Menezes, baterista do Kid Abelha e produtor.
I Me Mine
A banda paulistana Tinta Preta não teve chance de participar do projeto “Álbum Branco” em 2008, mas em dezembro o guitarrista Lula e a vocalista Érika estiveram na festa realizada no Astronete Bar de São Paulo e ficou acertado que participariam. Eles sugeriram algumas canções e eu acabei ficando com “I Me Mine”, e depois que veio a idéia de convidar a ternurinha Wanderléa para cantar com eles. Na época da Jovem Guarda, todos faziam versões de músicas dos Beatles – menos justamente Roberto, Erasmo e Wanderléa. Roberto só foi gravar uma, e em versão em português, em 1984 (“And I Love Her”), mas Wanderléa até hoje não o tinha feito em língua alguma. E topou fazer em inglês e fez bonito em maio de 2009, com auxílio precioso de Lalo Califórnia na edição dos canais de voz. Dig It
Esta faixa não é exatamente uma canção, é praticamente uma vinheta no formato lançado no LP “Let It Be” de 1970. Só os fãs conhecem a longa versão integral, que é efetivamente uma jam dos Beatles com o tecladista Billy Preston. Daí bateu a vontade de fazer algo diferente, já que seria ridículo alguém ficar repetindo aquelas coisas que John Lennon falou de improviso na hora da gravação. O Astronauta Pingüim, tecladista gaúcho radicado em São Paulo, foi a pessoa certa, pois eu o convidei, mostrei a jam integral dos Beatles, e ele fez algo muito criativo. Nem todo mundo vai gostar, suponho, mas também nem todo mundo gosta de “Dig It” mesmo.
Let It Be
Também lá atrás, antes do início dos trabalhos, ainda em outubro de 2008, Guarabyra demonstrou interesse em participar deste novo projeto. Ele havia comparecido ao lançamento do “Álbum Branco” na FNAC da Av. Paulista em setembro e estava animado. O tempo foi passado, nosso contato era esporádico, mas ele me disse que Zé Rodrix estava reservando estúdio. Como sabemos, infelizmente Zé Rodrix faleceu repentinamente em 22 de maio. Ivan Lins, que eu havia convidado para fazer “The Long and Winding Road”, que por sua vez estava sendo solicitada por Raimundo Fagner, nem percebeu a troca por “Let It Be” quando liguei pra agendar a gravação em junho (rsrsr). Ele gravou o piano em casa, com voz guia, e depois viajou para o Japão. Na volta, encontrou a base gravada pelo produtor Clemente Magalhães e seus músicos e ficou encantado. Realmente ficou linda, surpreendente mesmo. “Let It Be”, como “Yesterday”, “Hey Jude” e “The Long and Winding Road”, são clássicos ingratos de se recriar. Mas eles conseguiram. Maggie Mae
A banda mineira Operação Tequila foi uma das mais entusiasmadas pelo projeto “Álbum Branco” em 2008, e também uma das mais competentes. Eles fizeram uma versão “early beatles” para “Martha My Dear” e, quando pensei em “Maggie Mae” para o “Projeto 69”, resolvi chamá-los para fazer uma versão bem merseybeat para aquela tradicional das docas de Liverpool. Era uma cançãozinha infame, sobre uma prostituta de Liverpool etc, então talvez por isso na época da “invasão britânica” nenhuma banda inglesa fez uma gravação dela. Foi aí que fiz Rodrigo Andrade ouvir muito Gerr & The Pacemakers, muito Swinging Blue Jeans etc, pra criar esta sensacional versão “63” da música. Tudo a ver com o espírito “Get Back” dos Beatles em janeiro de 1969, já que eles resgataram diversas pérolas de seu baú durante aqueles ensaios (falaremos mais sobre isso no Vol. 2).
I’ve Got a Feeling
Conheci a cantora e compositora Danni Carlos em outubro de 2007, na semana em que criamos a comunidade que deu origem ao projeto “Álbum Branco”. Ela ficou inicialmente empolgada e chegou a dizer que participaria, mas depois sumiu... e só reapareceu no final de 2008, quando através de Rodrigo Sabatinelli mandou o recado de que participaria do novo projeto. Eu liguei e combinamos que ela faria “I’ve Got a Feeling” – embora ela achasse que Cássia Eller já tivesse gravado bem demais. Eu ponderei que Cássia só havia feito breve citação, ainda que eterna, na abertura de sua versão quase autoral de “Por Enquanto” (Renato Russo) em 1990. Danni criou uma levada meio Portishead com músicos de sua banda e já trouxe praticamente pronta para o estúdio quando fechamos a gravação com guitarras e efeitos em abril último, pouco antes dela isolar-se do mundo no reality show “A Fazenda” da TV Record.
One After 909
O repertório da fase “Get Back” foi o primeiro a ser definido e era óbvio que o Ultraje a Rigor era a banda perfeita para gravar “One After 909”, uma das músicas que os Beatles sacaram do baú durante os ensaios e que foi a única efetivamente gravada para o disco deles. Ao procurar Roger Moreira por email, ele me surpreendeu dizendo que o Ultraje já tocava a canção. Então eles gravaram rapidamente em estúdio e a gravação finalizada foi uma das primeiras que recebi.
The Long and Winding Road
Inicialmente pensei num piano man para fazer esta canção e Ivan Lins foi o artista que personificou o conceito. Lembrava bem de Ivan ao piano, cantando “Yesterday” no “Submarino Verde e Amarelo 2” que co-produzi em 2000. Mas, quando Raimundo Fagner manifestou desejo de gravar a canção e o trio Sá, Rodrix & Guarabyra deixou de gravar “Let It Be” por conta do falecimento de Zé Rodrix, acabei trocando a faixa de Ivan e confirmando esta para Fagner gravar. Ele acabara de gravar seu novo CD no estúdio Corredor 5, com produção do Clemente Magalhães, após tê-los apresentado no final de 2008, então Fagner gravou com uma moçada de Fortaleza. Mas Clemente finalizou com o tecladista Leo Fernandes no Rio, onde a faixa também foi mixada.
For You Blue
Quando o projeto 69 começou a ser pensado, eu tinha vontade de reunir em estúdio os membros originais da banda Os Incríveis. Conheço todos eles e convivemos bastante no ano passado, então tudo caminhava para tal mas no final ficou complicado demais levar a idéia adiante. A participação dos quatro lendários músicos dos anos 60 – Nenê, Netinho, Risonho e Manito – seria balão de ensaio para um projeto dos quatro reunidos, mas o tempo mostrou que isso seria uma missão impossível. Excelente baixista e músico em geral, Nenê Benvenuti gravou toda a base de “For You Blue” sozinho – num rhythm & blues sensacional que mostra que ele deveria fazer mais coisas por aí.